Casadas! Mariées!

Por onde começar? Dois anos atrás eu me apaixonei perdidamente. Dois meses depois do nosso primeiro beijo decidimos morar juntas. Quatro meses depois eu tinha a certeza absoluta que queria acordar todos os dias da minha vida ao lado dela. Semana passada, depois de muitos meses de planejamento, papelada e burocracia, nós nos casamos no consulado geral da França em Jerusalém. Conclusão? O amor move montanhas e tudo é possível na Terra Santa.

Recém casadas, saindo do consulado da França em Jerusalém. Note que na primeira foto do post, por falta de amigos/familiares presentes, jogamos arroz em nós mesmas. Será que dá sorte do mesmo jeito?

As comemorações começaram ontem. Fizemos um brunch em casa e convidamos os amigos que moram aqui. Preparei alguns pratos e pedi pra cada pessoa trazer algo pra comer ou beber. Algo vegano, claro. Dos presentes no brunch, sete eram veganos, um vegetariano e nove onívoros. Sempre me emociono ao ver meus amigos não-vegs comer minha comida e dizer que adoraram. Dessa vez a emoção foi ainda maior já que quando disse que gostaria que eles trouxessem algo vegano pro brunch ninguém (nem meus amigos palestinos ultra carnívoros) reclamou e no final todos elogiaram a comida e me agradeceram. Foi lindo ver meu amigo Ala chegar com uma caixa de achocolatado de soja, que ele confessou nem suspeitar da existência até aquela manhã, e meu amigo Ghassan, que nunca passou um dia sequer da sua vida sem comer um pedaço de carne, dizer que queria se mudar pra minha casa pra poder degustar minha comida todos os dias.

Anne adora tanto comida quanto eu, embora ela prefira mil vezes comer do que preparar comida. Queríamos celebrar nosso casamento de maneira descontraída, cercada por amigos verdadeiros e ótima comida. Essas fotos são da primeira parte do buffet. Tinha (feito por mim) salada de batata e pesto, salada de feijão fradinho, patê de tomate seco, (feito pelos convidados) salada de macarrão, creme de pimentão grelhado, bolinhas de massa folhada recheadas com azeitonas, vegan cream cheese, pão pita e baguete integral. Pra beber: três tipos de suco fresco, chá preto com frutas vermelhas (“Mariage Frères”, uma das minhas marcas preferidas de chás) e café da Eritrea, presente de uma amiga que acaba de chegar de uma visita  a esse país. Pra quem não sabe (eu não sabia até ontem), o café nasceu na região da África onde hoje fica a Etiópia e a Eritrea. Nossa amiga Sophie explicou que nesses países o café é quase sagrado e que eles torram os grãos verdes e moem minutos antes de preparar o café. O ritual todo leva quase duas horas e é repetido religiosamente todos os dias. Espero ter outra oportunidade de provar café da Eritrea pois sem dúvida nenhuma foi o melhor café que já tomei.

Também tinha mangas, uvas, figos secos, azeitonas pretas, pimentão vermelho em tirinhas e chips apimentados sobre a mesa. A segunda parte do buffet (Anne estava ocupada comendo e não tirou fotos) tinha: (feito por mim) bolinhos de aveia e passas, (feito pelos convidados) compota de figos e alecrim, pêras em calda e mousse de chocolate. Seguidos de mais café e chá verde com flores e frutas (“Le palais des thés”, minha outra marca preferida de chás).

Ghassan (de costas) durante sua missão impossível: convencer quatro vegs que carne é a coisa mais deliciosa do planeta. Isso foi antes dele provar as comidas sobre a mesa e voltar correndo pra cozinha dizendo: “Eu quero me mudar pra sua casa e comer isso todos os dias”. Ghassan é um dos nossos (poucos) amigos palestinos que sabe que somos um casal. Depois de ter nos felicitado pelo casamento ele disse: “Se por acaso alguém causar qualquer tipo de problemas pra vocês, essa pessoa vai se ver comigo e com a minha família”. Ele vem de uma das maiores e mais importantes famílias cristãs da região e ninguém aqui quer ter problemas com eles. Ghassan mora no meu coração e não paga aluguel, como diria minha irmã Edna.

Temos a imensa sorte de ter amigos dos mais diferentes meios e países. Nessa foto tem representantes da Alemanha, Turquia, França, Itália, Palestina e Israel.

Moramos em uma casa palestina tradicional que tem cerca de cem anos, feita com pedras extraídas nos arredores da cidade. As paredes têm quase um metro de espessura e o teto é em forma de cúpula. Mas a melhor parte dessa casa é o pequeno pátio, onde realizamos todos os eventos durante os meses quentes. Quando transformo minha casa em restaurante, por exemplo, é aqui que comemos. No fundo tem uma escada que leva a um jardim com oliveira, limoeiro, figueira, vinhas… As vezes eu e Anne tomamos café embaixo da figueira, escutando os passarinhos. Agradeço sempre aos céus por morar tão bem (principalemente quando penso na kitinete de 14m², com banheiro do lado de fora e no sexto andar de um prédio sem elevador em Paris onde morei durante seis anos).  A planta do lado esquerdo foi o presente de casamento de duas amigas francesas.

Conseguimos fazer uma pequena celebração descontraída, tranquila e delicada. Exatamente como queríamos. Uma comemoração com a nossa cara. Mas essa foi só a primeira de uma série de celebrações. Quando uma brasileira casa com uma francesa na Palestina, é impossível fazer uma  festa só. No final do ano terá um brinde na família de Anne e em Julho do ano que vem uma grande festa na França. A festa no Brasil por enquanto ainda não tem data.

Pedimos a alguns amigos pra tirar fotos com a máquina de Anne. Essa foto, tirada por Andrea, um amigo italiano, é a minha preferida. Tudo que sobrou da maravilhosa mousse de chocolate de Johanna (a amiga alemã que me ensinou a fazer mutabal).

Eu, tomando o precioso café da Eritrea, e minha esposa. Anne é minha esposa! Anne é minha esposa! Continuo repetindo isso pois ainda parece maravilhoso demais pra ser verdade.

Não sei se estávamos mais felizes pelo reconhecimento da nossa união, pelo triunfo do nosso amor ou por ter amigos maravilhosos que respeitam nossas escolhas (sejam elas amorosas ou gastronômicas) e nos apoiam incondicionalmente. Eu sinto um imenso orgulho do nosso casal, da nossa história, dos nossos valores, dos nossos amigos e da vida que escolhemos ter.

Uma vida guiada exclusivamente pelo amor. Amor uma pela outra e amor ao próximo.

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