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pasta com couve flor assada e molho de nozes

Lavar louça produz um efeito curioso na minha pessoa. Enquanto minhas mãos estão ocupadas, minha mente levanta voo. Impressionante como encarar fixamente a parede em cima da pia funciona como um trampolim pra minha imaginação. E olha que estou falando de uma parede coberta de azulejos beges sem graça. Nem ouso imaginar o tipo de devaneio que uma janela (com uma paisagem) desencadearia.

Por exemplo, outro dia estava eu a pensar, entre espuma de detergente e pratos sujos, o seguinte absurdo: se eu pudesse convidar qualquer pessoa pra jantar aqui em casa, quem eu convidaria? Pro exercício ficar ainda mais interessante me dei o direito de escolher entre vivos e mortos. Tem quem pense no que levaria pra uma ilha deserta, ou quem levaria pra cama… Eu, graças à minha obsessão com comida, penso em quem convidaria pra jantar.

Primeiro pensei em grandes personalidades, ídolos e heróis. Clarice Lispector sempre me fascinou, mas seu jeito arisco (que descobri em uma antiga entrevista da TV Cultura) me assusta. E jantar assustada deve dar indigestão. Por mais que eu admire Gandhi, seus votos de frugalidade fazem dele a pessoa menos recomendada pra dividir um jantar gourmet. Ivan Illich, meu herói absoluto, diria coisas tão incríveis que meu interesse pela comida desapareceria completamente.

Depois pensei em convidados que fazem parte da minha lista dos mais atraentes. Adriana Calcanhotto, por quem eu cultivei uma paixão platônica durante toda a adolescência, Chico Buarque, e sua voz absolutamente deliciosa, Jodie Foster, que fala Francês com um sotaque irresistível… Todos têm em comum a inteligência, que pra mim é o maior afrodisíaco. Só tem um problema aqui: pessoas extremamente inteligentes me fascinam, me atraem e… me intimidam. Dos três citados acima só cheguei perto de Adriana Calcanhotto e fiquei completamente paralisada. Se a cozinheira estiver paralisada o jantar será um desastre. E a última coisa que quero nessa vida é que Chico Buarque volte pro Rio falando mal da minha comida. O que aconteceria com a minha reputação de cozinheira?

A solução seria convidar uma pessoa bacana e divertida, mas que não fizesse parte nem da lista dos heróis nem da lista dos mais atraentes. Então pensei em Jessier Quirino, um poeta/contador de causos que acho fantástico. E ele é da Paraíba, então é um vizinho meu no Brasil. Imaginei ele chegando aqui em casa…

-Opa! Então você é de Natal? Imagino que preparou algo da terrinha. Adoro carne de sol, camarão…

– Jessier, eu sou vegana.

-Você é o quê, minha filha?

-Vegana. Sabe como é, não como nenhum animal, nem leite, nem ovos…

-Agora pronto! Vim parar nesse fim de mundo pra jantar vento?

Então desisti de convidar Jessier Quirino. Zeca Baleiro é um moço bacana. Não é tão engraçado quanto Jessier, mas tem uma das vozes mais lindas que já ouvi e tenho certeza que seria uma boa companhia. E além de ser outro vizinho do Nordeste (ele é do Maranhão), ele é descendente de libaneses.

– Seja bem-vindo, Zeca!

– É um prazer estar aqui na Palestina. Sabia que meus avós eram libaneses?

-Sim, sim.

-Gosto muito do Oriente Médio. Acho a comida daqui fantástica! Essa ruma de carneiro assado, hum… A propósito, qual é o menu?

-(Suspiro…) Francamente, Zeca, tanto problema aqui no Oriente Médio e você fica aí pensando em comida! Esperava mais sensibilidade da sua parte.

E assim acabaram meus sonhos de convidar alguém famoso pra jantar aqui em casa. Não acredito que pessoas onívoras gostariam de ser tele-transportadas pra Palestina pra dividir um jantar com uma brasileira vegana.

Mas de uma coisa eu tenho certeza: o prato que serviria nessa ocasião absurda seria essa massa com couve-flor assada e molho de nozes. Essa é a minha arma (comestível) infalível pra quando onívoros vêm comer aqui em casa. Mesmo os onívoros que antipatizam com a culinária vegetal adoram. Então pensei que seria legal dividir essa receita com vocês. Se por acaso algum dia Chico Buarque bater na sua porta na hora do jantar, você estará preparado(a).

pasta com couve flor assada e molho de nozes2

Massa com couve-flor assada e molho de nozes

Esse molho de nozes foi inspirado de uma receita tradicional italiana. Usar pão pra fazer um molho pra macarrão pode parecer uma ideia maluca, mas confie em mim (e nos italianos). O pão se mistura com o azeite e a água e se transforma em uma emulsão extremamente cremosa. Todo mundo pensa que tem creme no molho. As nozes casam maravilhosamente bem com a couve-flor e o tomate seco deixa tudo ainda mais irresistível. Não se assuste com a quantidade de couve-flor. Acho que assim fica mais gostoso e a textura fica mais interessante. E acreditem quando digo que esse prato amolece o coração de qualquer onívoro (ou não).

1kg de couve-flor, cortada em pedaços pequenos (buquês e talos)

1/2x de nozes

1x de pão picado (pode ser integral ou não)

1-2 dentes de alho, de acordo com o seu gosto

3cs de azeite extra virgem

2cs de tomate seco picado (de preferência do tipo que não é conservado no óleo)

1/2cs de levedo de cerveja maltado (opcional. Não use levedo comum!)

Sal e pimenta do reino a gosto

Um punhado generoso de salsinha fresca

250g de macarrão (tagliatelle e penne são os meus preferidos aqui)

-Em uma travessa grande, regue a couve-flor picada com 2cs de azeite, sal e pimenta do reino a gosto e leve ao forno quente até ficar ligeiramente dourada e macia, mais ainda ligeiramente crocante (al dente). O tempo de cozimento vai depender do seu forno (aqui em casa leva de 25 a 35 minutos). Mais explicações sobre como assar couve-flor aqui.

-Toste as nozes em uma frigideira seca até ficarem douradas dos dois lados.

-Coloque o pão, nozes tostadas, alho, 3cs de azeite, 1cs de tomate seco picado, a levedura de cerveja maltada (se estiver usando), 1/2x de água, sal e pimenta do reino a gosto no liquidificador e triture até ficar bem cremoso. Prove e corrija o sal, se necessário. Junte o resto do tomate seco, misture com uma colher (não triture) e reserve.

-Quando a couve-flor estiver assada baixe o fogo e coloque uma panela grande com água salgada pra ferver. Cozinhe o macarrão al dente. Antes de escorrer reserve 1/2x do líquido de cozimento. Coloque o macarrão escorrido de volta na panela junto com a couve-flor assada. Junte a água do macarrão ao molho (ainda no liquidificador), misture bem e distribua sobre o macarrão/couve-flor. Misture bem e sirva polvilhado com bastante salsinha fresca picada e mais pimenta do reino (melhor se for moída na hora). Rende 4 porções.

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sanduiche omelete veg

Eu fico feliz em saber que minha euforia contagiou muita gente e meu omelete vegano de grão de bico apareceu em muitas mesas. Ele continua fazendo muito sucesso aqui em casa e acabo de criar uma nova versão com linhaça no lugar da farinha de aveia. Eu queria que o omelete ficasse completamente sem glúten e a linhaça não só resolveu o problema como deixou a receita ainda mais nutritiva. Agora meu omelete é vegano, cheio de proteína e fibra, sem glúten e fonte de ômega 3!

E tem mais! Descobri que esse omelete fica uma maravilha como recheio de sanduíche. Como ele é um pouco seco, é importante passar uma pasta cremosa no pão ou incluir ingredientes suculentos, como o que fiz aqui. Mais um sanduíche vegano delicioso pra minha lista!

Omelete vegano de grão de bico (versão melhorada, sem glúten)

Faça tudo igual à receita original, mas substitua a farinha de aveia por 2 1/2cs de linhaça moída. Eu descobri dois truques simples pra impedir os omeletes de se quebrarem na hora de virar. Primeiro: coloque um pouco menos de massa, pra que o fundo da frigideira não fique totalmente coberto (deixe uma borda livre de aproximadamente 2cm ao redor do omelete). Assim você terá espaço pra inserir a espátula na hora de virar, sem machucar a parte exterior do omelete. Segundo: despeje a massa quando a frigideira estiver bem quente, espalhe e deixe cozinhar os primeiros 20-30 segundos em fogo alto (em seguida diminua o fogo). Fazendo isso o omelete vai criar imediatamente uma casquinha crocante, mais resistente, e se manterá intacto na hora de virar.

Sanduíche de omelete com pimentão assado e abacate (vegano)

Esse sanduíche é bom frio ou quente. Se quiser uma versão quente, não toste o pão antes de montar o sanduíche e coloque o sanduíche pronto em uma máquina de panini ou uma chapa quente por alguns instantes.

Omelete vegano de grão de bico (versão com aveia ou linhaça) Pra fazer o sanduíche da foto juntei também um pouquinho de tomate picado à massa do omelete. Outra dica: substitua a salsinha por coentro (fica melhor com abacate).

Pimentão assado (veja como assar pimentão nesse post), em tiras

Abacate, em fatias

Sal, pimenta do reino, suco de limão e azeite

Pão em fatias (usei um pão semi-integral com sementes)

Regue o abacate fatiado com bastante suco de limão, sal (seja generoso(a), pois abacate precisa de uma boa dose de sal pra brilhar) e pimenta do reino. Toste levemente o pão. Espalhe o abacate sobre uma fatia de pão, cubra com duas camadas de omelete (corte pedaços proporcionais ao tamanho do pão) e disponha tiras de pimentão assado por cima. Tempere com sal e pimenta do reino. Regue a segunda fatia de pão com azeite e feche o sanduíche (a parte com azeite deve ficar em contato com o recheio). Deguste imediatamente.

livro projeto

No início desse mês o livro de receitas palestinas que eu criei pra arrecadar fundos pro projeto de mulheres no campo de refugiados de Aida ficou (enfim!) pronto. Além de ensinar a fazer 15 receitas tradicionais, o livro explica a situação dos refugiados palestinos e conta a história do projeto. Ele é o fruto de três árduos meses de trabalho e quando o segurei nas mãos pela primeira vez senti uma mistura de alegria e alívio. Nunca imaginei que fazer um livro (sozinha) fosse tão penoso: entre recolher as receitas, fotografar os pratos, escrever os textos e fazer o design/layout, quase perco o juízo. Mas agora que ele está aqui olhando pra mim, estou extremamente feliz por ter controlado a vontade de desistir e ter ido até o final. (Clique nas imagens pra aumenta-las.)

livro projeto1livro projeto2

No início queríamos usar o dinheiro da venda do livro pra fazer um jardim de infância pras crianças especiais do campo. Mas só tínhamos verba pra publicar cem exemplares e como o dinheiro não será suficiente pra dar início a esse novo projeto, decidimos deixar esse sonho pra mais tarde. Então o dinheiro do livro será usado pra organizar uma viagem pras dez famílias do projeto. Se tudo correr como o planejado, em abril iremos ao mar morto, passar o dia tomando sol, piquenicando e nos banhando naquela água salgadíssima. Devido à situação econômica difícil (a taxa de desemprego em Aida é de 70%!), essas famílias raramente saem do campo, então a viagem será o acontecimento do ano e desde janeiro as crianças só falam disso.

livro projeto3Queria mostrar algumas das fotos do nosso livro, pra vocês verem o mimo que ele ficou, e aproveitar pra compartilhar mais uma receita palestina. Adas fat é um prato muito humilde, feito com lentilha (que os palestinos chamam de “a carne do pobre”) e pão. Ele é consumido principalmente no inverno, quando o corpo precisa de alimentos que aquecem e reconfortam.  Essa receita é tradicionalmente vegana, mas a versão que vocês veem aqui é um tiquinho diferente da versão do livro. Islam, que me ensinou a fazer adas fat, usa somente cebola, lentilha, água e sal na sua sopa. Eu gosto de incrementar um pouquinho, juntando mais dois ou três ingredientes. Mesmo ‘incrementada’, essa receita é extremamente simples, barata e nutritiva. O tipo de receita que quebraria um galhão pros estudantes veg(etari)anos, ou qualquer pessoa que queira um jantar rápido, fácil de preparar, mas cheio de proteína (e completa!) e outros nutrientes.

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Em novembro, quando falei que estava escrevendo esse livro, alguns leitores ficaram muito interessados. Pensei em fazer uma versão digital do livro em Português, já que não seria viável enviar exemplares pra tão longe. Mas por causa dos meus diferentes projetos não terei tempo de traduzi-lo esse ano (o livro foi escrito em Inglês). Porém se alguma alma caridosa se oferecer pra fazer a tradução (são só 37 páginas, muitas delas com fotos), eu aceitarei de muito bom grado!

*Zaaki significa ‘gostoso’ em Árabe. O título completo do livro em Português é: Zaaki– Receitas palestinas saborosas direto da nossa cozinha no campo de refugiados de Aida.

adas fat

Adas fat (sopa palestina de lentilha coral e pão)

Lentilha coral cozinha mais rápido e tem um sabor mais suave do que lentilha verde. Ela é tradicionalmente usada em sopas, pois se desfaz durante o cozimento (nunca tente fazer uma salada com esse tipo de lentilha!). Se você não conseguir encontrar lentilha coral na sua cidade, sugiro essa outra receita palestina que usa lentilha comum.

1 cebola grande, picada

4 dentes de alho, ralados/picados

1x de lentilha coral

2 tomates, picados

Uma pitada generosa de cúrcuma

1 folha de louro

Azeite, suco de limão, sal e pimenta do reino a gosto

Pão, de preferência integral

Aqueça 1cs de azeite e doure a cebola. Junte o alho e cozinhe mais 30 segundos. Acrescente a lentilha coral, os tomates, a cúrcuma, o louro, sal e 1 litro de água. Quando começar a ferver baixe o fogo e deixe cozinhar, coberto, até a lentilha ficar bem macia. Desligue o fogo e tempere com pimenta do reino, 1cs de azeite e suco de limão a gosto (usei o suco de  ½ limão grande). Prove e corrija o sal (talvez você queira junta mais um pouco de suco de limão também).

pão e azeite

Toste o pão até ficar ligeiramente crocante. Rasgue o pão em pedaços e distribua nos pratos onde for servir a sopa (cerca de duas fatias pequenas por porção). Regue o pão com azeite (1cs por porção) e cubra com a sopa quente. Rende 4 porções.

*Pra complementar a refeição: esse prato é tradicionalmente servido com uma salada crua de tomate, pepino, pimentão e salsinha, temperada com sal, azeite e suco de limão. Os legumes crus aumentam a dose de vitaminas da refeição e são o complemento perfeito pra esse prato (que já tem a proteína da lentilha e os carboidratos complexos do pão integral).

gratin batata cogumelo2

Muitas, muitas luas atrás publiquei minha receita de gratin dauphinois vegano. Ainda gosto muito desse prato, mas batata sozinha nunca é muito excitante pra mim, então criei uma versão mais interessante.  Batata e cogumelo nasceram um pro outro!

Eu adoraria utilizar cogumelos selvagens, como os exóticos e perfumados cogumelos que encontro quando estou na França, mas por aqui isso é impossível. Os únicos cogumelos que encontro em Belém são os brancos (champignon ou cogumelo de Paris), que não são nem de longe os mais saborosos. Mas descobri que se eu mistura-los com um pouquinho de cogumelos selvagens desidratados o prato se transforma completamente. Então sempre que passo pela França compro alguns potinhos dos meus cogumelos preferidos desidratados (cèpes, chanterelles, morilles, trompettes-de-la-mort…) e posso preparar gratins e risotos de cogumelo sublimes o ano inteiro. Desde que descobri esse truque, misturo sempre cogumelos frescos com cogumelos desidratados e assim aproveito o melhor dos dois lados: o sabor intenso dos cogumelos desidratados e a textura suculenta dos cogumelos frescos.

Nessa receita uso somente 15g de cogumelos desidratados, mas é impressionante como uma quantidade tão pequena desse ingrediente faz uma diferença tão grande. O delicioso sabor do cogumelo penetra na batata macia e tudo é envolvido em uma camada generosa do meu voluptuoso creme de castanhas. Aconselho degustar esse gratin em uma noite fria, junto de uma pessoa que você ama, e vocês se sentirão envolvidos em um cobertor de aconchego, enquanto borbulhas de alegria invadem seus estômagos.

Se você perdeu o post sobre minha receita de espinafre com creme, onde explico em detalhes porque o meu creme de castanhas de caju é a melhor invenção depois da roda, vou relembrar os pontos mais importantes. Meu creme de castanhas tem exatamente metade das calorias do creme de leite de vaca, metade da gordura, somente 13% da gordura saturada e ZERO colesterol. E ainda é rico em proteínas e ferro, duas coisas que não estão presentes no creme de leite de vaca (creme de leite é praticamente só gordura e gordura, junto com açúcar, são os dois únicos alimentos desprovidos de proteínas). Estou fazendo uma campanha pra que as pessoas parem de temer a gordura/calorias das oleaginosas e incluam esses alimentos extremamente nutritivos no cardápio. Não deixe de ler esse post pra entender melhor os benefícios das oleaginosas. E se você ainda não testou meu espinafre com creme, só posso dizer uma coisa: quem provou, adorou.

 gratin batata cogumelo

Gratin de batata e cogumelo

Quando reidrato cogumelos secos sempre aproveito a água na receita: esse líquido é absolutamente delicioso e seria uma pena (um crime!) joga-lo fora! Aqui o líquido entra na composição do creme de castanhas e deixa o gratin ainda mais saboroso.

4 batatas médias (aprox. 800g), descascadas e cortadas em rodelas de espessura média

1 cebola grande, em fatias finas

2-4 dentes de alho, ralados/amassados

300g de cogumelos brancos frescos, em fatias finas

15g de cogumelos escuros secos (shitake, porcini ou uma mistura)

1x de castanha de caju, de molho por 6 horas (ou mais)

1cc de amido de milho (maizena) ou fécula de araruta

1/4cc de noz moscada ralada

1cs de azeite

Sal e pimenta do reino a gosto

Castanhas do Pará raladas, pra polvilhar (opcional)

Ferva 1x de água e despeje sobre os cogumelos secos. Deixe hidratar por meia hora. Enquanto isso prepare os legumes. Cozinhe as batatas no vapor ou na água salgada até elas começarem a amolecer, mas retire do fogo antes que cozinhem completamente. Escorra os cogumelos secos, reservando todo o líquido, e pique finamente. Coloque a castanha escorrida (reserve a água), o amido de milho, a noz moscada e uma pitada generosa de sal no liquidificador. Cubra com o líquido dos cogumelos mais 2x de água (utilize a água onde as castanhas ficaram de molho e complete com mais água até obter 2x). Triture até a castanha se desintegrar completamente (esfregue um pouco do líquido entre os dedos pra conferir).  Aqueça o azeite em uma panela grande e doure a cebola. Junte o alho e deixe cozinhar mais 30 segundos. Despeje os cogumelos frescos, tempere com uma pitada generosa de sal e cozinhe, mexendo de vez em quando, durante alguns minutos (só o suficiente pros cogumelos começarem a murchar). Acrescente os cogumelos secos hidratados e as batatas pré-cozidas e salgue a gosto (se você cozinhou as batatas na água salgada, provavelmente não precisara juntar mais sal). Junte o creme de castanha, mexa pra que todos os legumes fiquem envolvidos em creme e deixe cozinhar em fogo baixo até o creme começar a borbulhar. Prove o creme e corrija o tempero, se necessário. Transfira tudo pra uma travessa de vidro. A minha tem 20cmx29cm, com 5cm de altura e é perfeita pra essa receita (o que vocês veem nas fotos são os restos do gratin, que transferi pra uma travessa menor na hora de requentar). Polvilhe generosamente com pimenta do reino (melhor se for moída na hora) e leve ao forno médio. O gratin está pronto quando as batatas estiverem extremamente macias (teste com a ponta de uma faca) e ligeiramente douradas (no meu forno leva entre 20-30 minutos). Se seu forno tiver a função grill (o meu tem!), passe o gratin pronto alguns minutos sob o grill pra que ele fique ainda mais dourado e forme uma casquinha crocante no topo. Sirva bem quente, polvilhado com castanhas do Pará raladas (eu não tenho castanha do Pará em casa no momento e o gratin da foto estava sem) acompanhado de uma salada verde simples. Rende 4 porções.

*Pra complementar a refeição: Pra deixar a refeição equilibrada do ponto de vista nutricional acrescente um prato à base de leguminosas, acrescente um prato à base de leguminosas, como essa salada de lentilha e pera ou essa salada de vagem, tomate e espinafre, por exemplo.

omelete grão de bico

Faz tempo que não fico tão animada com uma receita. Na verdade estou eufórica! Esse omelete de grão de bico é mais que uma receita, é uma descoberta. Passei muitos, muitos meses tentando dominar a arte dos crepes de grão de bico, um prato tradicional em várias partes do mundo. No sul da França é chamado de ‘socca’, na Índia de ‘chilla’ ou ‘puda’ e a Itália tem uma verão cozida e depois frita chamada ‘panelle’. E, pasmem, todas essas receitas tradicionais são veganas. O conceito pode parecer estranho pra nós, mas eu confio nos italianos, indianos e franceses, então o negócio devia ser muito bom! Eu precisava embarcar no trem dos crepes de grão de bico urgentemente.

O problema é que todas essas receitas tradicionais usam o mesmo ingrediente: farinha de grão de bico. O grão de bico seco (cru) é triturado até atingir a textura de uma farinha fininha, mas esse produto, encontrado facilmente em mercearias indianas, não é vendido aqui. Nas receitas tradicionais que citei acima, a farinha de grão de bico é misturada com água e temperos, depois cozinhada na frigideira/forno ou frita. Comprei um quilo da farinha na França ano passado e embora tenha tido um relativo sucesso com ela, pra mim não faz sentido postar receitas que meus leitores não poderão fazer em casa.  Então comecei a procurar alternativas que poderiam ser utilizadas por todos.

Meu primeiro impulso foi triturar grão de bico cru no liquidificador pra fazer a farinha em casa, mas fiquei com tanto medo de quebrar o meu amado liquidificador que nunca tentei. Eu tenho uma máquina ultra potente (um Vitamix) e talvez ele tivesse dado conta do recado, mas pra quem usa liquidificadores domésticos acho que isso não seria uma boa ideia. Um dia, olhando um vendedor de falafel fritar seus bolinhos, tive um momento ‘eureca!’. Falafel, um dos quitutes mais populares do Oriente Médio, também é feito com grão de bico (e também é vegano, HA!). Pra fazer essa delícia você coloca o grão de bico de molho uma noite, depois tritura no liquidificador até formar uma pasta, acrescenta vários temperos, algumas verduras e depois frita. Será que eu poderia usar a mesma técnica pra fazer meus crepes de grão de bico?

massa omelete

Testei minha ideia no dia seguinte e fico muito, muito feliz em dizer que deu certo. Se você triturar grão de bico demolhado por no mínimo 12 horas (coloco de molho à noite e só faço a receita no almoço do dia seguinte, deixando de molho por umas 15 horas) com um pouco de água, você obtém uma mistura parecida com a tradicional farinha+água. Os ingredientes são os mesmos, só a técnica varia. Depois é só temperar bem, pois grão de bico puro é sem graça, e deixar cozinhar até ficar dourado dos dois lados. Minhas tentativas com farinha de grão de bico+água nunca me deixaram totalmente satisfeita. Acabei mudando um pouco os ingredientes, aumentando o tempo de cozimento e, depois de muitos testes, achei enfim a receita perfeita.

Eu não sei o que o danado do grão de bico tem, mas não é que o sabor lembra vagamente (vagamente!) omeletes feitos com ovo? (Se você não gosta do sabor de ovos, nada tema: essa receita é neutra o suficiente pra não incomodar suas papilas.) Não os omeletes clássicos franceses, mas um outro tipo que fez parte da minha infância. Quando eu era pequena, minha irmã mais velha tinha uma receita que eu adorava (puristas do omelete, olhem pro lado). Ela separava as claras das gemas, misturava as gemas com cebola, pimentão, tomate, coentro e uns bocadinhos de fubá, batia as claras em neve e juntava ao resto dos ingredientes antes de fritar. Era um omelete ligeiramente esponjoso e meio seco, provavelmente culpa do fubá, mas eu achava aquilo uma delícia.

Essa minha receita lembra muito o omelete da minha infância, só que melhor (desculpa, Lila). Por isso decidi chama-la de ‘omelete vegano’ e não ‘crepe’ ou ‘panqueca’. E também porque, sendo à base de grão de bico, essa receita é rica em proteína (como os omeletes feitos com ovos) e conta como uma porção de leguminosas, enquanto crepes e panquecas são feitos de farinha de trigo e não passam de carboidratos. Eu prefiro não chamar minhas criações vegetais pelo mesmo nome de criações à base de produtos de origem animal, mas ao usar uma palavra conhecida por todos pra descrever essa receita, ela parece menos exótica e intimidante, além de indicar de qual categoria ela faz parte (proteína ou, como dizem lá na minha terra, “mistura”).

omelete grão de bico2

Nas últimas semanas me diverti muito com ela: recheei com ingredientes diferentes, fiz mini omeletes, que tostei no forno (depois de cozidos na frigideira) até ficar bem crocante (um ótimo substituto pras torradinhas que acompanham patês), fiz uma versão ‘mexida’ que usei como recheio de sanduíche, cortei omeletes cozidos e frios em tirinhas, misturei com arroz e verduras e fiz uma espécie de ‘arroz chinês’… As possibilidades são infinitas!

Como disse no início desse post, faz tempo que não fico tão animada com uma receita. Esse omelete usa ingredientes simples e baratos, é nutritivo, prático, muito, muito saboroso e ainda é extremamente versátil. Não que eu esteja procurando versões vegetais de todas as comidas de origem animal que fizerem parte da minha vida pre-veganismo, mas é sempre uma maravilha descobrir receitas coringas que podem se transformar em tantas outras coisas.

PS. Um omelete ou uma omelete? Depois do tagine, me deparo mais uma vez com um prato de gênero gramatical duvidoso. A palavra deriva do Francês (“omelette”) e nessa língua ela é feminina. Cresci ouvindo ‘o omelete’ e juro que não consigo mudar agora. Felizmente o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, diz que pode ser os dois. E como ele tem valor de lei, cada um escolhe o que preferir. Mas se quisermos manter o gênero gramatical de origem de todos os pratos franceses que entraram na nossa cozinha, deveríamos dizer “a fondue” e “a crepe” também.

 omelete grão de bico3

Omelete vegano de grão de bico

Com um mínimo de prática você fará esses omeletes com as mãos amarradas nas costas, mas talvez suas primeiras tentativas não fiquem perfeitas. É essencial usar uma frigideira boa, que não grude muito (as de ferro são as minhas preferidas), espalhar uma camada fina de azeite e usar uma espátula de metal pra virar os omeletes. Também é muito importante deixar o omelete cozinhar até ficar totalmente cozido no interior (prove um pedaço pra testar: grão de bico cru tem um sabor desagradável), pois se seu fogo estiver muito forte ele vai dourar por fora antes de cozinhar completamente. Essa receita rende 5 omeletes grandes, mas eu faço um ou dois por vez, guardo o resto da massa na geladeira por alguns dias e vou usando aos poucos. Assim posso preparar uma refeição rápida, nutritiva e saborosa em pouco tempo. Enquanto o omelete cozinha preparo uma salada crua e o almoço fica pronto em 15-20 minutos.

Update: Veja a versão atualizada dessa receita aqui.

1x de grão de bico cru (seco), de molho por 12 horas ou mais

4cs de aveia em flocos

3 dentes de alho

1/4cc de cúrcuma

Uma pitada de ervas finas desidratadas

1cc cheia de fermento

Sal e pimenta do reino a gosto

1 cebola, picadinha

Um punhado de salsinha, picada

Azeite

Recheio (opcional)

Espinafre refogado com alho e cebola, temperado com sal e pimenta do reino + tomates secos

Escorra o grão de bico demolhado e bata com 2x de água no liquidificador. Seja paciente e triture até ele se desfazer completamente. Esfregue um pouco da mistura entre os dedos pra conferir: ela deve ficar macia, sem pedacinhos inteiros. Junte a aveia, o alho, cúrcuma, ervas, fermento, sal (usei 1cc rasa) e pimenta do reino a gosto e bata novamente por alguns segundos.  Transfira a mistura pra um recipiente grande e junte a cebola e a salsinha. Misture bem, prove (grão de bico cru tem um sabor desagradável, então não se assuste), corrija o sal e reserve. Aqueça uma frigideira grande (escolha a que grudar menos na sua casa) e com tampa. Quando ela estiver bem quente, espalhe um pouco de azeite, formando um filme (não precisa exagerar). Despeje um pouco da mistura de grão de bico no centro da frigideira e use uma colher pra espalhar a massa, como se estivesse fazendo um crepe/panqueca. Minha frigideira é bem grande e uso uma concha e meia de massa pra cada omelete. Adapte a quantidade de massa ao tamanho da sua frigideira. O omelete deve ficar relativamente fino, porém mais espesso que uma panqueca. Tampe e deixe cozinhar em fogo médio-baixo por 8-10 minutos (o tempo de cozimento vai depender do tamanho da sua frigideira e, consequentemente, do seu omelete). Quando a superfície estiver seca, o omelete parecer firme e as bordas ligeiramente douradas, está na hora de virar (cuidado: se você tentar virar cedo demais ele vai se partir).

omelete grão de bico4

Espalhe um fio de azeite sobre o omelete e use uma espátula de metal fina pra virar (talvez você precise fazer movimentos curtos de vai-e-vem pra descolar). Deixe cozinhar do outro lado (ainda em fogo médio-baixo), descoberto, por mais 5-6 minutos. Seu omelete deve ficar bem dourado dos dois lados, mas não crocante, então fique de olho: se ele parecer muito pálido, aumente o fogo, se estiver queimando, diminua.

omelete grão de bico5omelete grão de bico6

Com um pouco de prática você saberá exatamente qual temperatura e tempo de cozimento funcionam pra você e sua frigideira. Coloque agora o recheio pronto em uma das metades e dobre o omelete, como mostram as fotos. Sirva imediatamente. Se estiver fazendo mais de um, mantenha os omeletes prontos (recheados ou não) no forno baixíssimo, coberto (com papel alumínio ou, como faço aqui em casa, entre duas travessas) pra não ressecar. Essa receita rende 5 omeletes grandes. Se não quiser fazer todos os omeletes de uma vez, guarde o resto da massa em um recipiente fechado na geladeira por até 3 dias.

*Pra complementar a refeição: esse omelete, por ser à base de grão de bico, conta como uma porção de leguminosas (proteína). Acompanhe de uma salada crua e/ou legumes salteados e, se a fome for grande, inclua uma porção de cereais (arroz integral, por exemplo). No dia da foto servi com brócolis refogado, purê de batata e cenoura e uma salada crua (que não apareceu na foto).